
Calvin, personagem de história em quadrinhos, criado por Bill Watterson, apresentado, entre outras formas, em tiras publicadas diariamente pelo jornal “O Estado de São Paulo”, revela-se bastante cativante e atual.
A trama gira em torno do cotidiano de uma família bem encaixada nos moldes atuais – a propósito, modelo imposto pelos meios de comunicação -, engloba personagens como o pai, a mãe, a baby sitter Rosalyn, um garotinho e uma garotinha (colegas de escola), o tigre de pelúcia Haroldo e o destacado Calvin.
Destinado a apontar sutilmente a conflitiva realidade social, Calvin, filho único, garotinho de seis anos de idade, bastante hábil, apronta incríveis diabruras, está sempre em pé de guerracom suas tarefas diárias, como escola, banho, acordar cedo, arrumar o quarto etc e chega a conclusões mirabolantes acerca de si próprio e de tudo ao seu redor, que o autor expõe claramente ou simplesmente insinua.
É frequentemente acompanhado de seu incomparável amigo Haroldo, qua assume vida própria às custas da imaginação de Calvin, funcionando como grande amigo, palpiteiro, conselheiro e ainda opinando e explicando coisas em diversas oportunidades – sendo possivelmente a prórpia consciência de Calvin e, portanto, tão importante quanto o protagonista.
O leitor é pego de improviso com suas idéias extravagantes, pois adora entreter-se com coisas impossíveis e perigosas (fios de extensão, serra elétrica etc) ou brincadeiras intrigantes (usar a garagem como clube, atendente de “opiniões sinceras” entre outras). Calvin chegainclusive a questionar a espécie humana, as atitudes de seus pais, a escola, a televisão e outros assuntos diversificados.
Seus paisassumem posturas contraditórias diante de suas perguntas científicas. Sua mãe tenta responder corretamente, enquanto seu pai nunca mostra a realidade das coisas e ainda sugerindo falta de raciocínio lógico da companheira.
Para que possam se distrair, contratam a baby sitter Rosalyn e mesmo assim não conseguem sossego, pois Calvin liberta suas brincadeiras destruidoras, piores do que as que deixam sua mãe maluca, de modo que, consequentemente, surge uma delicada antipatia mútua. Ou seja, o autor focaliza a tragicomédia das soluções da vida familiar moderna.
Em sua vida escolar, não menos conturbada, mostra-se com espirituosa destreza mental (intelectual incompreendido!!) ou repugnado pelos colegas, agoniando sua profesora.
Na verdade, seu relacionamento social é muito deficiente, o que faz concluir que é um gênio, ou seja, uma criança prodígio sofrendo pela incompreensão. Em consequência, brinca quase sempre sozinho, junto com Haroldo, além, é claro, de sua dependência à TV e aos aparelhos eletrônicos utilizados diariamente.
Os quadrinhos deixam claro, inclusive, as influências recebidas pela programação de TV, o que leva ao consumismo desmedido. Como, por exemplo, em uma tira do cereal matinal cuja composição não é nada aconselhável, mas que oferece prêmios, ou quando cria seu próprio super herói, “o homem-estupendo”, campeão da liberdade, que voa, é contrário à tirania e que tem a força de um milhão de homens.
Finalizando, Calvin consegue, em tiras, manipular sutilmente os leitores, que, cativados, nem mesmo percebem; e ainda se divertem em doses diárias, como qualquer outro personagem... porém, de forma explêndida!!